Sistema Bethesda e Classificação dos Nódulos de Tireoide

Sistema Bethesda e Classificação dos Nódulos de Tireoide

A punção aspirativa por agulha fina (PAAF) tem um papel essencial na a avaliação de pacientes com nódulo de tireoide. Este procedimento reduz a taxa de cirurgias desnecessárias da tireoide para pacientes com nódulos benignos e permite uma triagem cirúrgica adequada dos pacientes com câncer de tireoide . Antes do uso rotineiro da PAAF da tireoide, a porcentagem de glândulas ressecadas cirurgicamente devido à nódulos malignos era de cerca de 14% .Hoje,  com o advento da PAAF, a porcentagem de nódulos malignos ressecados supera os 50%.

É fundamental que os citopatologistas comuniquem os achados da punção de tireoide e sua interpretação de forma sucinta e inequívoca para que o médico solicitante possa conduzir adequadamente cada caso. Historicamente, a terminologia utilizada na descrição de uma paaf de tireoide variou significativamente de um laboratório para outro, criando confusão em alguns casos e dificultando o compartilhamento de informações clinicamente útil entre as instituições.

Com o objetivo de uniformizar os achados da PAAF de tireoide e universalizar a terminologia utilizada na sua descrição, foi realizada uma conferência em Bethesda (daí o nome da classificação) no ano de 2007 denominada de “Thyroid Fine Neddle Aspiration State of the Sciente”. O encontro permitiu uma padronização e classificação dos achados microscópicos oriundos de uma punção dos nódulos da tireoide.

Sistema Bethesda e Classificação dos Nódulos de Tireoide
Sistema Bethesda e Classificação dos Nódulos de Tireoide

Classificação de Bethesida

O objetivo primordial da classificação é desenvolver uma terminologia uniforme para relatar os resultados da PAAF da tireoide. Um sistema amplamente utilizado e validado que serviu de inspiração para a proposta da tireoide foi o Sistema Bethesda utilizado na interpretação de citologia cervical, conhecido como Papanicolau. Os achados de uma punção de tireoide são classificados em 6 categorias por esse sistema. Cada categoria possui um risco implícito para câncer de tireoide (indo desde 0 a 3% na categoria benigna à virtualmente 100% na categoria maligna). Abaixo vamos descrever em maiores detalhes cada categoria e seu significado.

Categoria I. Não diagnóstica ou insatisfatória

A primeira coisa a ser avaliada em uma punção de tireoide é a adequação do material enviado. Amostras inadequadas são descritas como “não-diagnósticas” ou “insatisfatória”. Esta categoria aplica-se a materiais cuja análise microscópica se encontra prejudicada devido à presença de sangue que dificulta sua caracterização, esfregaços excessivamente espessos, esfregaços excessivamente “secos”, ou ainda presença de número insuficiente de células foliculares. Para um esfregaço de PAAF da tireoide ser considerado satisfatório para avaliação, devemos ter pelo menos 6 grupamentos de células foliculares, sendo que cada grupamento deve possuir pelo menos 10 células. Existem algumas exceções com relação à exigência de um número mínimo adequado de células, como por exemplo, quando existe abundância de colóide no esfregaço, mesmo com um número inferior de células foliculares àquele relatado como adequado, consideramos como um esfregaço benigno.

Categoria II. Benigno

O benefício da PAAF de tireoide deriva em grande parte da capacidade que o método tem de se fazer uma interpretação confiável de benignidade e assim evitar cirurgias desnecessárias. Um resultado “benigno” é obtido em 60% a 70% das PAAFs da tireoide. O termo “nódulo folicular benigno” aplica-se ao padrão benigno mais comum: um esfregaço composto adequadamente de proporções variáveis ​​de colóide e células foliculares de aspecto benigno dispostas como macrofolículos ou fragmentos de macrofolículos. E se ressecados, virtualmente todos os nódulos foliculares benignos serão nódulos de um bócio multinodular ou adenomas foliculares. Esta distinção não pode ser feita pela PAAF, porêm também não tem consequências maiores para o paciente. A taxa de falso-negativo de um resultado benigno é baixa (0% -3%), podendo os pacientes fazer seguimento por ultrassonografia com intervalos de 6 a 18 meses. Se o nódulo tiver crescimento significativo ou alterações ultrassonográficas “suspeitas”, a PAAF pode ser repetida. Outra alteração classificada como benigna é a “tireoidite linfocítica”, também conhecida como tireoidite de Hashimoto.

Tireoide Hashimoto
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Categoria III. Atipia de significado indeterminado (ASI) ou lesão folicular de significado indeterminado

Algumas punções da tireoide não são facilmente classificadas como categoria benigna, suspeita ou maligna. Tais casos representam uma minoria de PAAFs da tireóide, e no Sistema Bethesda são relatados como “atipias de significado indeterminado” (ASI) ou “lesão folicular de significado indeterminado”. Os cenários mais comuns de achados citológicos que permitem a classificação do esfregaço nesta categoria são:

  • Presença de uma população proeminente de microfolículos em um aspirado que não preenche os critérios para “neoplasia folicular/suspeita de neoplasia folicular (categoria IV)”. Essa situação pode surgir quando existe a predominância de microfolículos em um aspirado esparsamente celular com colóide escasso.
  • Há uma predominância de células de Hürthle em um aspirado esparsamente celular com colóide escasso.
  • A interpretação da atipia de células foliculares é dificultada pela presença de artefatos causados durante a preparação dos esfregaços.
  • Existem características focais sugestivas de carcinoma papilífero, incluindo núcleos aumentados com cromatina pálida, alterações no contorno e forma nuclear em um esfregaço de aparência predominantemente benigna (especialmente em pacientes com tireoidite de Hashimoto ou com colóide abundante e células foliculares benignas).
  • Há um infiltrado linfóide atípico, mas o grau de atipia é insuficiente para a categoria geral “suspeito de malignidade.”

Um resultado de “atipia de significado indeterminado” é obtido em cerca de 3% a 6% das PAAFs de tireoide. Taxas mais altas provavelmente representam o uso inapropriado desta categoria quando a alteração deveria ser classificada em outra categoria. O manejo recomendado é a correlação clínica e uma nova PAAF em um intervalo apropriado. Na maioria dos casos, a repetição da PAAF resulta em uma interpretação mais adequada e classificação em uma outra categoria. Entretanto, cerca de 20% dos nódulos permanecerão classificados como “atipia de significado indeterminado”. Em alguns casos, no entanto, o médico pode optar por não repetir a PAAF e observar clinicamente o nódulo, ou ainda encaminhar o paciente para cirurgia devido à suspeição clínico-radiológica.

O risco de malignidade para um nódulo AIS  é difícil de ser avaliado, porque apenas uma minoria de casos nesta categoria tem acompanhamento cirúrgico. Aqueles que são ressecados representam uma população selecionada de pacientes com resultados repetidamente de AIS ou ainda pacientes com achados clínicos ou ultrassonográficos preocupantes. Nesta população selecionada, 20% a 25% dos pacientes com AIS provou ter câncer após a cirurgia, mas este resultado é sem dúvida superestimado, não sendo o real risco de câncer para aqueles nódulos classificados como AIS. O risco de malignidade é certamente menor e provavelmente mais próximo de 5% a 15%. Um esforço deve ser feito para usar esta categoria como um último recurso e limitar seu uso a aproximadamente 7% ou menos de todos os resultados de uma PAAF.

Categoria IV. Neoplasia folicular ou suspeita de neoplasia folicular:

O objetivo desta categoria é identificar um nódulo que pode ser um carcinoma folicular (CF) e triar esse paciente para uma lobectomia cirúrgica. A PAAF de tireoide é considerada diagnóstica para muitas condições patológicas da tireóide (como por exemplo o carcinoma papilífero ou a tireoidite linfocítica). Entretanto, no que diz respeito ao carcinoma folicular, podemos considerá-la como um exame de triagem. Os carcinomas foliculares têm características citomorfológicas que os distinguem dos nódulos foliculares benignos. Embora estas características citomorfológicas não permitam sua distinção de  um adenoma folicular (AF), eles são relatados como “neoplasia folicular” (NF) ou “suspeito por um neoplasia folicular ”, acarretando em um procedimento diagnóstico definitivo, geralmente uma lobectomia. O termo “suspeito para neoplasia folicular” é preferido por alguns laboratórios em detrimento de “neoplasia folicular” para esta categoria, porque uma proporção significativa de casos (até 35%) não são neoplasias, mas sim proliferações hiperplásicas de células foliculares, mais comumente as do bócio multinodular.

Cerca de 15% a 30% dos casos desta categoria provaram ser de origem maligna. Entretanto, a maioria dos casos classificados nesta  categoria são adenomas foliculares ou nódulos adenomatosos de um bócio multinodular. Dentre aqueles diagnósticos de malignidade, boa parte são carcinomas foliculares, porém, um considerável parcela são variantes foliculares de carcinomas papilíferos.

Categoria V. Suspeito de malignidade

Muitos tipos de câncer de tireoide, principalmente o carcinoma papilífero da tireoide (CPT), podem ser diagnosticados com certeza pela PAAF. Entretanto, algumas mudanças arquiteturais e nucleares de alguns destes tumores são sutis e focais. Isto é particularmente verdade na variante folicular do carcinoma papilífero, o que pode dificultar sua diferenciação de um nódulo folicular benigno. Em outros casos, pode existir uma amostra incompleta das alterações, acarretando em um pequeno número de células anormais. Se apenas 1 ou 2 características do CPT estiverem presentes e se elas são apenas focais e não difundidas em toda a população de células foliculares, ou se a amostra tem celularidade esparsa, um diagnóstico de malignidade não pode ser feito com certeza. Tais casos ocorrem com alguma regularidade e são melhor classificados como “suspeitos de malignidade”, qualificados como “suspeito de carcinoma papilífero. A maioria desses nódulos (60-70%) são diagnosticados como carcinomas papilíferos.

Categoria VI. Maligno

A categoria “maligna” é usada sempre que as características citomorfológicas são conclusivas para malignidade. Comentários descritivos que se seguem são usados ​​para subclassificar a malignidade e resumir os resultados de estudos especiais, se houver. Aproximadamente 3% a 7% das PAAFs da tireoide têm características conclusivas de malignidade, e a maioria são carcinomas papilíferos. Os nódulos malignos geralmente são removidos através da tireoidectomia, com algumas exceções (por exemplo, tumores metastáticos, linfomas não-Hodgkin e carcinomas indiferenciados). O valor preditivo positivo de uma desta categoria é de 97% a 99%.

13 thoughts on “Sistema Bethesda e Classificação dos Nódulos de Tireoide

  1. Izabella Rocha Ribeiro says:

    Dr, minha punção de tireoide deu amostra insatisfatória…e a médica pediu 8 meses para repetir o exame…o que o Sr aconselha? Fiqueipreocupada…obrigada!

  2. Isabella says:

    Bom dia.
    Dr, a minha conclusão deu :
    1- Nódulo LD da tireóide: Maligno, consistente com carcinoma papilifero ( Bethesda Vl).
    2- Linfonodo cervical nível 2: Carcinoma papilifero metastático.

    É muito grave, tem como fazer a cirurgia e estar ok ?
    Obg se puder responder!.

  3. Alceli Pereira says:

    Bom dia. Fiz punção e deu nível V, é maligno ou benigno? É necessário quimioterapia após cirurgia?Desde já agradeço a atenção.

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